Mais uma do amor
Amor, quando contei sobre aquela terrível doença
Você chorou.
A cirurgia, os exames,
A fraqueza do depois do corpo aberto
E eu ouvi sua voz.
Chorei tanto.
É isso.
Nós choramos.
Vivemos saudades,
A alegria, alegria.
Nos amamos nas crises de riso que temos na cozinha.
Por alguma bobagem momentânea
E vai ser sempre assim.
Através do tempo que desgasta tudo.
O esmalte, as roupas, as pessoas, o corpo, os sentimentos...
Ele só não desgasta esse mistério
O amor.
Fabiana B. Farias
(Outubro de 2010) Read more...
essas coisas do amor e do ódio...
© Foto de Jean Marc Bouju. Filho abraça o pai em campo em campo de prisioneiros. Iraque 2003 |
narrar um assassinato é quase tão
difícil como dizer que te amo
como falar do sangue que se esvai ou
vc cantarolando numa aléia do horto de vestido florido
como descrever o terror dos olhos e o grito sequelado ou
vc vendo tv de calcinha de algodão
ou como dizer da arma ainda quente ou
seu corpo mole na cama
essas coisas do amor e do ódio
são impossíveis de narrar.
Chacal
Daqueles livros que mudam sua vida: O estrangeiro
Albert Camus. In: O estrangeiro Read more...
Daqueles livros que mudam sua vida: Romeu e Julieta
Linda, uma história horrível*
— Deixa eu te ver melhor — pediu.
Ajeitou os óculos. Ele baixou os olhos. No silêncio, ficou ouvindo o tic-tac do relógio da sala. Uma barata miúda riscou o branco dos azulejos atrás dela.
— Tu estás mais magro — ela observou. Parecia preocupada. — Muito mais magro.
— É o cabelo — ele disse. Passou a mão pela cabeça quase raspada. E a barba, três dias.
— Perdeu cabelo, meu filho.
— É a idade. Quase quarenta anos. — Apagou o cigarro. Tossiu. — E essa tosse de cachorro?
— Cigarro, mãe. Poluição.
Levantou os olhos, pela primeira vez olhou direto nos olhos dela. Ela também olhava direto nos olhos dele. Verde desmaiado por trás das lentes dos óculos, subitamente muito atentos. Ele pensou: é agora, nesta contramão. Quase falou. Mas ela piscou primeiro. Desviou os olhos para baixo da mesa, segurou com cuidado a cadela sarnenta e a trouxe até o colo.
— Mas vai tudo bem?
— Tudo, mãe.
— Trabalho?
Ele fez que sim. Ela acariciou as orelhas sem pêlo da cadela. Depois olhou outra vez direto para ele:
— Saúde? Dizque tem umas doenças novas aí, vi na tevê. Umas pestes.
— Graças a Deus — ele cortou. Acendeu outro cigarro, as mãos tremiam um pouco. — E a dona Alzira, firme?
A ponta apagada do cigarro entre os dedos amarelos, ela estava recostada na cadeira. Olhos apertados, como se visse por trás dele. No tempo, não no espaço. A cadela apoiara a cabeça na mesa, os olhos branquicentos fechados.
Caio Fernando Abreu. In: Os Dragões não Conhecem o Paraíso
*Um dos melhores contos do Caio. Justamente incluído em "Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século" na seleção de Ítalo Moriconi.
Para ler o conto todo: site releituras Read more...
Série Alfa 47
Adeus, Kiki
Ontem foi o dia de dar adeus para Kiki Peixoto. Ela se foi. Like Diva.
Kiki me ensinou muito tateando os sentidos, exorcizando os demônios e surgindo como sacerdotisa debaixo de maquiagem de Teatro Kabuki.
Não possuindo a materialidade ou a totalidade, Kiki era o corpo.
Respirava em linha reta.
Deslocou-se, mudou de estado
Kiki fechou a porta do inferno. E acabei fechando o meu inferno também.
Kiki antes da chegada do centauro pistoleiro sussurrou últimas palavras, inéditos.
Adolescentes Suicidas
Adolescentes são muito suscetíveis a cortarem os pulsos. Ela cortou as duas mãos e metade da língua.
Pés de barro
A mulher escreve um rolinho daqueles que as fãs escrevem para os ídolos. Carta de ternura ao homem, recado das possibilidades abertas e fechadas, fechadas e abertas. Pálpebra pisca sem cílios. Ela não quer enviá-la. Não quer mais.
Anestesiar o drama
Anestesiar o drama
Para poder seguir.
Existe uma loucura que pulsa nos genes
Pulsa no sangue
Em ritmo staccato
Pedindo para abrir a porta
Lá dentro,
Há ela.
Querendo ser eu
Querendo ser eterna
Segura na mão uma foto minha de criança
E aponta para o chão cheio brinquedos nunca usados
Ela me cobra.
Eu só quero fugir desta herança
Anestesiar o drama.
Esquecer ela dentro de mim.
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Um dia (II)
para Charles Miranda
Eu só observo.
Um dia chegou esse homem.
Precisava de dinheiro.
Filha-precisando-de-transplante-de-medula.
“Mas eu só observo.”
Pensei em dizer.
Ele falava
E fazia gestos para descrever cada palavra
Como quem fala com surdo-mudo.
A mão era seca.
“A nossa vida é seca”
Eu disse sem dizer.
Eu só observo.
Mas infelizmente escuto demais.
Fabiana B. Farias
(2010) Read more...
Hoje eu revisto os bolsos da tua calça.
Procuro as memórias.
Não as nossas,
As suas.
As felizes.
As que guardou só pra ti.
Fabiana B. Farias
2010 Read more...
Fool’s Glad
...
- Eu te amo
- Fool’s Glad is the secret, sugar…
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Diáfano
Daqui vejo tuas galerias de luzes e escuto ressoar, sereníssima, a batalha contínua
de tuas centopéias de aço
Do silêncio sobre quatro patas por trás das janelas fechadas.
As calçadas refletem o eco de velhos passos, milhares, bilhões
E nada refletem.
Das frinchas expostas ao sol, escorre em meio ao lodo negro,
A nossa história sussurrada
Em um caleidoscópio delirante
E a inconseqüência casual
Sem nexo.
A onda que te encobre súbita é feita de terno e da doce carne humana
Esses fugazes vultos
Que se afastam.
Fabiana B. Farias Read more...
Da Morte Azul
Jonathan Fontenelle
Jonathan Fontenelle,1981, piauiense, poeta e professor. Formado em Letras, pós-graduado em Literatura Portuguesa.
Só que ele é mais. É meu amigo e é um dos meus poetas favoritos.
parece que foi ontem, eu fiz
aquele chá de habu
pra te curar da tosse e do chulé
pra te botar de pé
(Los Hermanos)
Um dia
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Um sonho...
Sonho I
Fabiana B. Farias - sem data Read more...
SèrieAlfa.art i literatura Núm. 45
Da minha parceria com o poeta Joana Navarro. Que nunca se esquece de quem está do outro lado do Atlântico.
Um troço qualquer morreu...
E foi assim.
Você
Eu
E o passado cheio de veias e olhos
E foi assim.
Você
Eu
E o passado cheio
de.
E assim
no silêncio em que nos olhávamos
O vento
passava
pelos
nós.
Fabiana B. Farias Read more...
Eu juro...
Desculpa, eu tentei.
Ali estava.
Sentada na sala, todos os dias.
Oferecendo o melhor sorriso com as mãos apertadas na saia.
A minha ironia refinada
E você riu
( quantas vezes?)
do meu sarcasmo.
Mas por que sempre no olho do teu sorriso esse fio de raiva?
Eu te disse coisas bonitas
Gostava de ver você sorrir.
Eu te disse “saudade”, “afinidade” e um bocado de “sim”.
E por que de volta só tuas palavras e sentimentos virando rápido a esquina?
Eu gastei o que não tinha para te visitar em outra cidade.
Organizei os teus remédios.
Confiei o segredo do meu corpo descoberto.
E no meio desse encontro de sábado sei que perdi.
Perdi para tua postura de bote
Para a sensação riscada na carne, pendurada no teu sorriso crispado
Que falei além.
Descer as escadas da tua casa
Correr, fugir...
Eu que digo demais
Para tentar te ensinar um pouco de entrega.
Eu juro que tentei.... Mas acho que...
Não que eu seja santa.
Só tentei que acontecesse contigo
E eu...juro... que.
"- Obrigada pelos livros!"
Terminei.
E daqui pra frente te deixo livre pra pensar o pior de mim.
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